quinta-feira, 16 de março de 2017

DIP - OAB - Sujeitos

Sujeitos de Direito Internacional 

O sujeito de direito internacional ou pessoa jurídica de direito internacional é uma entidade com capacidade para possuir direitos e deveres internacionais e com capacidade para defender seus direitos através de reclamações internacionais.

Deste conceito, retira-se duas conotações da qualificação jurídica de sujeito de Direito Internacional Público:

a) passiva: sujeito de Direito Internacional Público é o destinatário da norma de Direito Internacional Público;
b) ativa: sujeito de Direito Internacional Público tem capacidade para atuar no plano internacional.


Da conotação ativa nasce o conceito de personalidade jurídica no plano internacional, que é a capacidade para agir internacionalmente


Os sujeitos de Direito Internacional Público podem ser classificados em:

a) Estados;
b) Coletividades Interestatais;
c) Coletividades Não-estatais;
d) Indivíduos.

Estados

Os Estados são os principais sujeitos de direito internacional. Diz-se que são sujeitos primários e plenos, tendo em vista que detêm subjetividade internacional incondicionada. Isso significa que correspondem integralmente às características normalmente atribuídas a sujeitos de direito internacional, como a capacidade de celebrar tratados, gozar de imunidades de jurisdição e capacidade de apresentar reclamações internacionais. Tendo em vista que existem outros sujeitos de direito internacional, não basta que uma entidade detenha personalidade jurídica internacional para que seja considerada Estado. Conforme estabelece a Convenção Interamericana sobre os Direitos e Deveres dos Estados, firmada em Montevidéu em 1933, é indispensável que preencha alguns requisitos específicos, a saber: 

a) população permanente; 
b) território determinado; 
c) governo soberano; 
d) capacidade de entrar em relação com os demais Estados.

Assim, enquanto sujeito de direito internacional, pode-se definir um Estado como sendo um agrupamento humano, estabelecido permanentemente num território determinado e sob um governo independente.

Reconhecimento de Estado
Consiste em um ato formal pelo qual o governo de um Estado aceita outra entidade como sendo um Estado e, portanto, como membro componente da sociedade internacional. Assim, pelo reconhecimento, os Estados constatam que um novo ente soberano passou a ter existência e está apto a manter relações com os demais componentes da sociedade internacional. Trata-se de ato jurídico unilateral, com consequências jurídicas. Na prática, contudo, são considerações de ordem política que levam um Estado a reconhecer outro ente como sendo um Estado. 

No entanto, cabe referir que se qualquer entidade exibir as características da qualidade de Estado, os demais entes que compõem a sociedade internacional, ainda que não o reconheçam, estarão obrigados a respeitar princípios de direito internacional público em relação a esse Estado (por exemplo: vedação ao uso da força). Com efeito, ainda que alguns não reconheçam Israel como sendo um Estado, todos estão obrigados a respeitar princípios de direito internacional em relação a ele.

 O reconhecimento tem, pelo menos, dois objetivos fundamentais. O primeiro é o de demonstrar a existência de um Estado como sujeito de direito internacional e o segundo é o de identificar que determinado ente tem condições de estabelecer relações com outras pessoas jurídicas de direito internacional.

A doutrina ainda debate acerca da natureza do reconhecimento, sendo que, para a maioria, o ato tem efeito declaratório, havendo, ainda, uma importante corrente que defende a tese contrária, qual seja a de que o efeito do reconhecimento é atributivo ou constitutivo

Para a primeira corrente, os efeitos jurídicos do reconhecimento são limitados, pois ele é mera declaração, confirmação de um estado de direito e de fato já existentes, tendo a personalidade jurídica sido conferida previamente ope legis. Assim, bastaria a configuração dos quatro elementos acima transcritos (população, território, soberania e capacidade de se relacionar com os demais Estados) para que um ente fosse considerado sujeito de direito internacional público, prescindindo do ato de reconhecimento. Assim, para os defensores dessa doutrina, o reconhecimento é um ato unilateral pelo qual o Estado admite a existência de outro, sem que dessa declaração dependa o ente para ser considerado sujeito de direito internacional público

Por outro lado, os defensores da tese atributiva defendem que o reconhecimento é um ato bilateral pelo qual é atribuída aos Estados, por consenso mútuo, personalidade internacional. Em outras palavras, a corrente distingue o nascimento histórico de um ente do nascimento da pessoa internacional. Portanto, a personalidade jurídica de um Estado surge com o seu reconhecimento. Isso significa que a própria personalidade jurídica de um Estado depende da decisão política de outros Estados.

 Teoria declaratória
reconhecimento é ato declaratório; admite a existência do Estado como sujeito de direito internacional sem o reconhecimento pelos demais.

Teoria constitutiva
reconhecimento é ato constitutivo; Estado só se torna sujeito de direito internacional após o reconhecimento dos demais.

Por fim, resta mencionar que, de acordo com a doutrina e a prática, um Estado criado em violação às regras do direito internacional não deve ser reconhecido

Reconhecimento de governo
A doutrina TOBAR, ou doutrina da legalidade, surgiu em 1907, quando o ministro das relações exteriores do Equador Carlos Tobar sugeriu que não deveriam ser reconhecidos os governos transitórios nascidos das revoluções até que fosse demonstrado que eles tinham o apoio dos demais Estados.

 A doutrina ESTRADA, por sua vez, surgiu em 1930, por obra de um mexicano de mesmo nome, e pregava que a prática do reconhecimento acabava por ferir a soberania dos países e configurar interferência indevida nos assuntos internos dos Estados.

De qualquer forma, para o direito internacional, o reconhecimento de um novo governo não significa reconhecimento de sua legitimidade, mas que este possui, de fato, o poder de dirigir o Estado e representá-lo internacionalmente. Por fim, resta mencionar que as formas de reconhecimento de governo assemelham-se às existentes para reconhecimento de Estado. Nessas condições, o reconhecimento de governo pode ser expresso ou tácito, individual ou coletivo, de jure (reconhecimento definitivo) ou de facto (reconhecimento provisório).


COLETIVIDADES NÃO ESTATAIS

Dentre as pessoas jurídicas de direito internacional público, destacam-se, ainda, as coletividades não estatais, cuja classificação e características são expostas a seguir.

Beligerantes
 São movimentos armados da população, politicamente organizados, que utilizem a luta armada (a ponto de constituir guerra civil) para fins políticos. Quando tais grupos mostram ter força suficiente para possuir e exercer poderes similares ao do Estado contra o qual se rebelam, inclusive controlando partes do território do Estado, a sociedade internacional pode reconhecer sua condição de beligerantes, atribuindo-lhes status de Estado, inclusive para submetê-los aos tratados sobre guerra. O reconhecimento como beligerante é aplicado às revoluções de grande envergadura, em que os revoltosos formam tropas regulares e que têm sob o seu controle uma parte do território estatal , como nas guerras civis, fundamentando o instituto no princípio da autodeterminação dos povos e nos valores humanitários que perpassam as relações internacionais. Exemplo histórico de beligerantes foram os Confederados da Guerra de Secessão dos EUA (1861-1865). O reconhecimento de beligerância é normalmente feito por uma declaração de neutralidade e é ato discricionário. Com as sensibilidades existentes nas relações internacionais, é normal que o primeiro Estado a fazê-lo seja aquele onde atue o beligerante. A prática do ato, porém, não obriga outros entes estatais a fazer o mesmo. As principais consequências do reconhecimento de beligerância incluem a obrigação dos beligerantes de observar as normas aplicáveis aos conflitos armados e a possibilidade de que firmem tratados com Estados neutros. O ente estatal onde atue o beligerante fica isento de eventual responsabilização internacional pelos atos deste, e terceiros Estados ficam obrigados a observar os deveres inerentes à neutralidade. Nas guerras, se sujeitam às leis, inclusive, as aplicadas aos prisioneiros. Os atos praticados pelos beligerantes em atividade não se imputam ao Estado. Os beligerantes que possuem navios não são considerados navios piratas, em razão de inexistir a finalidade lucrativa.                                       

  OS INSURGENTES
 Os insurgentes são grupos que se revoltam contra governos, mas cujas ações não assumem a proporção da beligerância, como no caso de ações localizadas e de revoltas de guarnições militares, e cujo status de insurgência é reconhecido por outros Estados. A maioria desses grupos que surgem visam a tomada do poder, mas não chegam a constituir uma guerra civil. Os direitos e deverem dos insurgentes dependem do que lhes é atribuído pelos Estados que os reconhecem. O reconhecimento de insurgência é ato discricionário, dentro do qual são estabelecidos seus efeitos, que normalmente não estão pré-definidos no Direito Internacional e que, portanto, dependem do ente estatal que a reconhece. Em regra, o reconhecimento do caráter de insurgente exime o Estado onde ocorre o movimento de responder internacionalmente pelos atos dos revoltosos e impõe, a todos os lados envolvidos em uma revolta, a obrigação de respeitar as normas internacionais de caráter humanitário. Há uma clara semelhança entre a beligerância e a insurgência. 

De qualquer forma, tanto o reconhecimento dos beligerantes quanto o dos insurgentes têm alcance constitutivo, pois a personalidade jurídica de tais entidades não decorre diretamente do direito internacional, mas unicamente do reconhecimento que lhes for dado. Portanto, as competências eventualmente reconhecidas a essas entidades são oponíveis apenas à entidade que as reconheceu. Em relação aos demais sujeitos de direito internacional que não aceitarem movimentos armados como sendo beligerantes ou insurgentes, nenhuma consequência jurídica decorre. Resta esclarecer, ainda, que o reconhecimento é sempre transitório, porquanto o movimento armado esgota-se, seja porque é reprimido, seja porque consegue atingir seus objetivos de secessão ou mudança de governo. Por fim, a decisão de reconhecer uma entidade como sendo beligerante ou insurgente é discricionária, cabendo a cada sujeito de direito internacional a opção                    

Movimentos de libertação nacional.
 Os movimentos de libertação nacional estão associados a movimentos que buscam a independência de um povo que se encontra sob regência colonial. Logo, seu reconhecimento significa o reconhecimento internacional da entidade como representante de determinado povo na sua luta para ganhar o direito à formação de um Estado independente conforme o direito de autodeterminação dos povos. Normalmente, esse reconhecimento é coletivo, por meio de organizações internacionais, ao contrário da situação de beligerância que, na maior parte das vezes, é individual. Na atualidade, tem-se atribuído à Autoridade Nacional Palestina a característica de movimento de libertação nacional, sendo que ela já foi reconhecida pela Liga Árabe e pela Organização pela Unidade Africana, entre outras organizações internacionais.
Em 2012, a ONU alterou a condição desse movimento, que deixou de ter status de entidade observadora, passando a ser Estado observador não membro.

Santa Sé
A Santa Sé compreende a reunião da Cúria Romana com o Papa. É, na verdade, a Cúpula da Igreja Católica. Por algum tempo, discutiu-se se ela teria ou não personalidade jurídica internacional, mas os acordos de Latrão, de 11 de fevereiro de 1929, celebrados entre a Santa Sé e a Itália, reconheceram a soberania territorial da Santa Sé e o seu direito à plena propriedade e jurisdição soberana sobre o Vaticano. Importante referir que a entidade que detém personalidade jurídica internacional é a Santa Sé, e não a Cidade do Vaticano, ainda que ele faça parte de algumas organizações internacionais como a União Postal Universal.  A relação entre a Cidade do Vaticano e a Santa Sé tem natureza sui generis. No Tratado de Latrão, Itália e Santa Sé conceberam a existência de um novo sujeito: a cidade do Vaticano, que é, na verdade, um Estado instrumental, a serviço da Santa Sé. Na verdade, a soberania da Cidade do Estado do Vaticano é originária, tendo em vista que decorre da própria existência do Estado, mas a sua representação e poder de governo estão sob a autoridade da Santa Sé. Logo, ela é integrante dele, formando um único ente jurídico. O Estado da Cidade do Vaticano, onde o Papado tem sua sede, detém os elementos constitutivos do Estado, à exceção da dimensão pessoal propriamente dita, pois a “população” nele existente é composta unicamente por seus funcionários. O Vaticano é, assim, um caso excepcional no que diz respeito aos sujeitos de direito internacional público. A Santa Sé, enquanto sujeito de direito internacional, tem os direitos de legação e convenção, é membro de organizações internacionais, goza de imunidade de jurisdição perante tribunais estrangeiros e participa de Convenções Internacionais, como a Convenção sobre o Direito do Mar de 1958 e as Convenções de Genebra de 1949 sobre a humanização da guerra. O Estado do Vaticano pode celebrar tratados com outros Estados por meio de seu Chefe de Estado (Papa) e participa de alguns organismos internacionais como a União Postal Universal e a União Mundial da Proteção da Propriedade Intelectual.

Comitê Internacional da Cruz Vermelha 
O Comitê Internacional da Cruz Vermelha é organização humanitária com natureza jurídica sui generis, porquanto se trata de entidade privada de direito suíço, de natureza não governamental, mas que possui status de pessoa jurídica de direito internacional.  Apesar de o Movimento Internacional da Cruz Vermelha ser formado por diversas entidades (Sociedades Nacionais da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho, Comitê Internacional da Cruz Vermelha etc.), é apenas o Comitê que possui capacidade jurídica para atuar no plano internacional. Tanto é assim que figura como observador nas Nações Unidas e celebra Tratados no âmbito do direito internacional humanitário.

ENTIDADES INTERESTATAIS (ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS)

As organizações internacionais podem ser conceituadas como a associação voluntária de Estados e/ou de outras entidades, constituída por meio de um tratado, com a finalidade de buscar interesses comuns por intermédio de uma permanente cooperação entre seus membros.

Têm, pelo menos, três características principais, que são o multilateralismo, a permanência e a institucionalização.

O multilateralismo refere-se à associação dos membros em torno do objetivo comum. Quanto à característica da permanência, pode-se afirmar que, em regra, as organizações internacionais são constituídas por tempo indeterminado. E, por fim, a institucionalização pode ser traduzida na ideia de que, por meio delas, se cria um espaço institucional de solução de conflitos e de relacionamento interestatal, conferindo-se ao sistema internacional considerável estabilidade.

 Os tratados constitutivos dão vida à organização, estabelecendo sua estrutura e objetivos. No entanto, nem sempre preveem expressamente a personalidade jurídica dessas entidades. Isso não significa, contudo, que elas não sejam consideradas sujeitos de direito internacional. A personalidade jurídica das organizações internacionais não deriva de sua própria natureza, mas da vontade dos Estados. Por isso, diz-se comumente que sua personalidade jurídica é derivada, enquanto a personalidade jurídica estatal é originária, decorrente de sua soberania.  A aceitação da personalidade jurídica internacional das Organizações internacionais se deu em 1949, quando a Corte Internacional de Justiça, no Parecer Consultivo Reparação de Danos, pronunciou-se a favor da existência da personalidade jurídica da Organização das Nações Unidas, apesar do silêncio da Carta nesse sentido. No Parecer, baseando-se nas características de permanência e em determinados elementos da estrutura da Organização, a Corte vislumbrou que o exercício dos objetivos da entidade (manutenção da paz e da segurança internacionais, desenvolvimento das relações internacionais entre as nações etc.) só seria possível se ela pudesse dispor, ao menos implicitamente, da personalidade jurídica internacional..

 Muitas são as classificações dadas pela doutrina para as Organizações Internacionais, sendo as mais comuns as seguintes:

Universal: Aceita como membro qualquer país e possui âmbito de atuação mundial. Ex.: Nações Unidas.
Regional Os Estados-membros pertencem a espaço físico delimitado. Ex.: Mercosul, União Europeia etc.
Organização de competência geral: Para realizar seus objetivos se envolve em praticamente todas as áreas da sociedade internacional. Ex.: Organização das Nações Unidas.
Organização de competência limitada: Tem como objetivos e funções apenas algumas áreas delimitadas, não importando se ela é uma organização universal ou regional. Ex.: Organização Mundial da Saúde, Organização Internacional do Trabalho.
Cooperação Tem por objetivo realizar suas finalidades por meio da cooperação, pressupondo a manutenção da soberania e independência dos Estados.
Integração Visa formar uma comunidade regional integrada, por meio da limitação do poder soberano dos Estadosmembros.

INDIVÍDUOS

A doutrina ainda controverte a respeito da personalidade jurídica de direito internacional dos indivíduos, sendo que a tendência é admiti-los nessa condição. Eles são, em grande medida, destinatários dos Tratados Internacionais, que lhes asseguram direitos a serem observados pelos Estados, e o próprio direito internacional, principalmente no pós-Segunda Grande Guerra, tem evoluído no sentido de proteger-lhes também por outras formas. No entanto, em regra, as normas não são diretamente aplicadas aos indivíduos, necessitando que sejam recepcionadas pelos ordenamentos jurídicos nacionais. Além disso, apenas por meio dos Estados ou Organizações Internacionais participam da elaboração de normas internacionais que lhes dizem respeito e, em regra, não têm acesso direto a todas as Cortes Internacionais. Assim, considerando que os indivíduos participam de forma ainda restrita da vida internacional, tem-se entendido que eles são sujeitos de Direito Internacional, mas com capacidade mitigada. A partir do momento em que há tribunais internacionais que aceitam suas reclamações (Corte Interamericana de Direitos Humanos, Corte Europeia de Direitos Humanos, Tribunal Penal Internacional), poderão exercer sua personalidade


 SUJEITOS SEM PERSONALIDADE JURÍDICA DE DIREITO INTERNACIONAL 

Existem várias entidades que não gozam de personalidade jurídica internacional, mas as confusões mais comuns estão em torno das Organizações Não Governamentais (ONGs) e empresas privadas. Ambas podem, de fato, atuar mundialmente, mas o direito internacional não lhes confere status de pessoa jurídica internacional. As ONGs são criadas para a defesa das mais diversas causas e, diferentemente das Organizações Internacionais, não são entidades intergovernamentais. Seu caráter heterogêneo é justamente o que dificulta a identificação de sua capacidade internacional. Exceção à regra é o Comitê Internacional da Cruz Vermelha, que, apesar de estar vinculado a uma ONG, tem personalidade jurídica de direito internacional. As empresas privadas, ainda que constituídas com capital acionário partilhado por duas nacionalidades (multinacionais) ou atuantes em diversos territórios (transnacionais), têm personalidade jurídica de direito privado, e são constituídas pelas leis internas dos Estados, não havendo que se falar, assim, em personalidade de direito internacional público

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